quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Efeito manada

Hoje é o último dia de 2009, também é meu aniversário. Nesse período, que compreende na universidade o que chamamos de “recesso de fim do ano”, já participei de encontros/ despedidas de amigos e companheiros de trabalho, assim como viajei ao litoral da Paraíba para rever parentes, grandes amigos, mergulhar na praia e beber muita cerveja gelada.

Entretanto, hoje em especial têm festa em todos lugares, nos canais de TV, estações de rádio e sites na internet. Eu decidi ficar em casa, ir contracorrente para variar.

Isso não é algo novo para mim, mas confesso que toda vez que faço tenho que ter certa “força de vontade”, porque o mais fácil a fazer é... O QUE TODO MUNDO FAZ! É o chamado “efeito manada”. Este é um típico assunto aqui para o Macaco Ômega, já que muitos simplesmente vão juntos, liderados por poucos, seguindo à massa.

Em “Deus – Um Delírio” Richard Dawkins fala sobre como mudamos no tempo, o “Zeitgeist” mutante (o espírito das épocas). O que quero pegar emprestado de Dawkins é o fato de que as mudanças são feitas, entre outros fatores, por líderes de todas as formas, os formadores de opinião. As massas os seguem prontamente, ou aos poucos.

Olhem só o que levou minha decisão de ficar em casa no réveillon? Pois é, aqui estou e não é fácil estar fora da massa, fazendo tudo que todos fazem, sentindo-se “normal”, aceito, participativo, sem pensar, sem complicar nada.

Eu não consigo fazer isso! Putz!

Registro apenas que em minha opinião a estrutura fundamental desse comportamento é genética pura. Ou seja, se sentimos uma força, em palavras mais suaves, um sentimento para seguirmos em determinada direção junto com outros, isso não foi aprendido, só pode ser genético.

Não quer dizer que o réveillon e o calendário ocidental sejam genéticos. Nem de longe! Estou escrevendo sobre fazermos algo espontaneamente, porque a maioria das pessoas faz. Óbvio, que isso foi benéfico para nossa sobrevivência nas savanas onde evoluímos. Muito além ainda, está em todo grupo de animais sociais. Para vivermos em grupo temos que afinar comportamentos coletivamente. Assim como uma colméia, ou um cupinzeiro, cada um de nós está imerso em uma coletividade.

Dos milhares de anos da origem do ser humano para cá, diferimos muito em ambiente cultural e tecnológico, embora nossas mentes continuem sendo pleistocênicas. Dessa forma, só posso compreender essa força, e toda a propaganda para estar com todos em uma festa de réveillon, como um subproduto de nossas origens como animais sociais.

É algo tão forte em nós, que, caso você não tenha notado, iniciei este texto com uma série de explicações para representar, defender a minha “normalidade” e meu lugar na manada.

Outro aspecto bastante interessante e relacionado ao efeito manada, são os papéis sociais que devemos cumprir no grupo. Um de meus amigos, Darlan de Oliveira Reis Júnior (professor do Departamento de História da Universidade Regional do Cariri – URCA/ CE), explicou-me certa vez que dependendo da profissão exercida, a sociedade tratará de lhe cobrar comportamentos e estilos de vida, na ilusão coletiva da existência dos estereótipos. Por exemplo, um professor de ecologia que ande com roupas de grife famosa e tenha um carro de luxo (categoria executiva urbana), provavelmente poderá ser confundido com um médico. Se as roupas forem ternos e gravatas então, advogado de sucesso (promotores inclusos), ou político. Papéis sociais, estereótipos, fantasias de grupo, modas e espírito de época, seguimos todos na manada humana.

Resolvi ficar em casa no réveillon! Estou feliz e espero que todas as pessoas também assim o fiquem hoje, seja lá se seguiram à manada ou não. Em cada canto desse mundo, nas fragilidades existenciais que nós somos, alguns momentos de paz para todos!

Abro uma cerveja gelada e com um sorriso saúdo a essa década de 2000, cujo último ano começará agora em 2010!!!

Como todos na manada fazem: Feliz Ano Novo!!!

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Reflexo ômega


É aqui que nos encontramos todos os dias: no espelho! Eu e eu, você e você refletidos um para o outro até o fim de nossos dias. Se há par perfeito, ele sempre será composto por você e seu reflexo que nunca irá te deixar.

Muito bem, a natureza nos dotou de mecanismos de amor próprio para que prossigamos. Ou seja, a sua imagem é melhor vista por você mesmo. Se há imperfeições estruturais, ou causadas ao longo da vida, é você prioritariamente quem olha sempre com a devida aceitação. Outros se embriagam tantos de si próprios que se tornam hedonistas de carteirinha e olham para sim mesmos de uma forma que ninguém mais é capaz de ver.

Somos animais sociais e vivemos em grupos hierárquicos. Isso é muito mais do que milenar, pois é assim bem antes mesmo dos primatas surgirem na Terra. Estamos sempre distribuídos em grupos e subgrupos com líderes eleitos por nós mesmos. Sejam eles presentes em seu dia a dia, sejam eles ausentes e resultado de um efeito emergente de nossos cérebros (*).

Entre 6,5 bilhões de macacos humanos a maioria não se tornará um líder alfa, caso contrário seria um caos. Calma, muitas pessoas são assim mesmo, acham que são líderes natos, compram livros de auto-ajuda com protocolos para se tornarem líderes, ou melhorar sua liderança. Filósofos e livres pensadores exaltaram a importância dos líderes e criadores, Friedrich Nietzsche (1885) e Leonardo Boff (1998) são exemplos disso. O primeiro deixou claro que sua filosofia não era escrita para “animais de rebanho”, antes do super-homem, aquele que se desgarra do rebanho tornar-se-á um "leão". O segundo autor também fez metáforas usando animais, pessoas passivas foram representadas por uma "galinha", e os líderes e donos de seu destino eram “águias”.

Se a moda das metáforas pega entre nós símios, além das vaidades que transfiguram alguns em pavões, imaginem um mundo composto apenas por leões e águias?!

Quero deixar claro, minha intenção não é ir contra essa corrente de emancipação das massas, ou mesmo do despertar da alienação. Apenas quero enfocar o exagero que isso representa para a “psique coletiva”, quanto de depressão estamos promulgando no mundo, porque nem todos seremos líderes. Pior ainda é quando alguém possui essa oportunidade e não tem qualquer espírito de liderança... Aí os monstros distorcidos surgem contra a vontade da maioria, entre ditadores e patrões exploradores, pessoas no lugar errado são uma catástrofe.

De forma direta e clara o que não vemos por aí é um livro do tipo “Compreenda o macaco ômega que está dentro de nós”. Eis o objetivo deste post!

Antes de mais nada, vamos relembrar o que sabemos sobre grupos sociais hierárquicos. Desconheço um grupo de animais vertebrados sem hierarquia. Mesmo em cardumes de peixes, alguns machos e fêmeas assumem papéis de dominância por tamanho, maturidade e força. Anfíbios e os vários grupos de répteis também possuem essa estrutura hierárquica quando formam grupos.

Nas aves sociais vejamos como são as galinhas: “no topo da hierarquia, usualmente está um macho e na base uma fêmea ou um macho. Somente os machos de nível hierárquico alto acasalam ou possuem haréns, outros machos passam a viver à margem da comunidade do galinheiro, pois os outros machos não lhes permitem acasalar e nem tampouco as galinhas os aceitam”.

Alguma similaridade conosco?! Pois é!!!

A organização hierárquica de um grupo pode não ser evidente e para detectar isso são empregadas observações etológicas criteriosas. No livro do etologista brasileiro Antônio Souto (2000 – Etologia: princípios e reflexões, Editora UFPE), é apresentado uma forma fácil de se calcular a posição hierárquica de um indivíduo dentro de um grupo. O uso da equação de Coulon (1975 apud Souto 2000) onde é mensurada a proporção de comportamentos agonísticos (com vitórias e derrotas entre as disputas de machos e fêmeas). Esse tipo de procedimento se aplica melhor a animais como preás (Cavia porcellus) e quatis (Nasua nasua), sendo menos adequado para espécies com um número baixo de interações agonísticas como macacos sauín (Saguinus midas), ou o peixe-boi (Trichechus manatus).

A hierarquia social pode ser linear quando há uma seqüência de posições. Por exemplo, em pequenos grupos de preás domésticos cada macho possui uma posição social característica e, em um local com três machos e três fêmeas (**), encontramos um macho de primeira posição (ou o alfa), o de segunda posição (o beta) e o de terceira e última posição (o ômega) (Souto, 2000: 129). Quando há uma ausência dessa seqüência, assume-se que o grupo possui uma hierarquia social não-linear. Isso ocorre quando, por exemplo, em um grupo de oito indivíduos, o sexto pode ter dominância sobre o da quarta posição, embora submeta-se ao da quinta, que por sua vez, é subordinado ao da quarta posição (Souto, 2000: 130).

Se dividíssemos didaticamente o mundo dos animais sociais dessa forma, é claro que estamos mergulhados em grupos hierárquicos não-lineares. Mas quero deixar claro para você, os dois extremos estão presentes, os de posição alfa e os ômega!

A máxima sobre isso compreende: nem todo mundo é alfa, mas todo mundo se recusa a aceitar ser ômega.

Gostamos de escrever e falar aos pulmões: somos complexos! Isso implica uma diversidade de fatores históricos, sociais, políticos e econômicos, além dos presentes em nossa natureza humana.

Como exemplo disso, vou usar as probabilidades de “se dar bem” em minha profissão. Sou professor/ pesquisador universitário, em minha formação sobraram discursos, dicas e ensinamentos de como os grandes cientistas se tornaram evidentes mediante a produção de publicações científicas. Descobertas e hipóteses ousadas publicadas em ótimas revistas parecem ser para muitos um caminho certo de reconhecimento, ascensão social e sucesso profissional.

Doce ilusão! Claro que fazer currículo é importante para se obter um emprego. Mas, no exemplo específico, ter um título de doutor e cinco artigos publicados é muito mais importante do que ter apenas mestrado e mais de 100 publicações revolucionárias. Sem contar que salário, ascensão profissional e condições de trabalho em minha vida dependeram mais da luta de classes (negociações políticas e até greves) do que ficar absorto no meu laboratório.

Já tinha escrito no Macaco Alfa sobre isso, nossas vidas não são assim planejadas, onde você cumpre um protocolo de regras e atitudes e... Pluft! Você ascende da massa anônima e passa a ser um líder (alfa)! Tem que estar no lugar certo, com as condições favoráveis, muita sorte, esforço e talento. As pessoas não gostam de ler sobre isso, parece que o controle das coisas escapa pelos dedos mediante os eventos estocásticos que compõem a vida.

Há duas semanas atrás foi publicado um artigo na revista Science do colunista norte-americano Beryl Lieff Benderly: “Taken for granted: shocked, shocked! To find disppointment on Campus” (algo como “Tido como certo: chocante, chocante! Encontrar desapontamento no Campus”). Em mais de 4.000 instituições de pesquisa e ensino superior dos Estados Unidos as carreiras acadêmicas bem sucedidas estão diretamente relacionadas com o prestígio das maiores instituições. Ou seja, as instituições-elite como Havard proporcionam o ambiente e condições para os mais brilhantes, mas isso não é o mesmo para quem está em instituições menores.

Há o sério problema de se ensinar mitos como o do cientista brilhante que surge em qualquer lugar, porque a maioria dos acadêmicos não serão encarnações de Charles Darwin e muitos deles irão se frustrar por isso. Curioso, segundo Benderly (2009), parece que essa percepção vem mais rápido para quem está abaixo. Professores em instituições pequenas e sem prestígio tendem a se chocar com a realidade logo no início de suas carreiras. Uma adaptação a isso consiste em rever valores e investir em outras atividades como ensino, extensão, família, amigos e hobbies. Já os que estão em instituição no topo da cadeia alimentar, mas não conseguem se tornar estrelas acadêmicas, o choque parece vir perto da aposentadoria... e é devastador! Depressão e desilusão para quem se achava naturalmente um macaco alfa e se vê ômega... a imagem que eles nunca enxergaram no espelho.

Por falar em auto-imagem, quando penso a respeito, lembro de uma passagem em um livrinho do comentarista da CBN, Mauro Halfeld (2009: 41): “em diversas pesquisas, a minoria dos entrevistados diz ser um motorista abaixo da média, quando na verdade, 50% deles deveriam se classificar assim. Apenas 20% dos alunos assumem obter notas abaixo da média em sua turma”.
É o ponto no texto que sou repetitivo para fixar a principal idéia: ninguém quer ser ômega!

Bem, tranqüilizo a todos que uma posição hierárquica ômega é para poucos desafortunados. Não estou escrevendo sobre ricos e pobres, porque essa divisão das pessoas é artificial. Há liderança em comunidades pobres! Aliás, se bilhões de pessoas são exploradas isso é algo histórico, não tem nada haver com a natureza humana.

A posição ômega natural em nossos grupos é para poucos, assim como a alfa. Entre um e outro está a maioria, estamos todos nós. Ora liderando, ora obedecendo, um pouco alfa, um pouco ômega.

Ao olhar no espelho e reconhecer nossas fraquezas, ou a falta de habilidade em alguma tarefa específica é uma inspiração humana que chamamos de humildade. Aos que nunca fazem isso, aqueles que acham que seu lado ômega está muito bem disfarçado, restará a desilusão de saber que certas coisas na vida nós conseguimos através de outros e nunca apenas por uma vontade individualista. Nunca conseguimos fazer tudo sozinhos, há sempre algo que somos incapazes de fazer.

Acho que à procura da felicidade e paz cotidiana está justamente nessa harmonia entre alfa e ômega.

Se não há livros sobre os macacos ômegas, agora pelo menos existe este blog, onde assumimos nossas fraquezas, tornamos-nos fortes e felizes!!!


Referências
Benderly, BL., 2009 [clique] http://sciencecareers.sciencemag.org/career_magazine/previous_issues/articles/2009_11_13/caredit.a0900141 Sobre galinhas li no site: [clique] http://goads.tripod.com/caracter.htm
Boff, L., 1998. O despertar da águia. Editora Vozes.
Halfeld, M., 2009. Patrimônio: para você ganhar mais e viver melhor. Editora Globo. (***)
Nietsche, F., 1995 [1885]. Assim falou Zaratustra – Um livro para todos e para ninguém. [8 ed.] Editora Bertrand.
Souto, A., 2000. Etologia – Princípios e reflexões. Editora Universitária da UFPE.

(*) Não deixe de ler sobre isso no Macaco Alfa: [clique:] Discriminados: Ateus http://macacoalfa.opsblog.org/page/30/
(**) As fêmeas dos preás normalmente não possuem uma hierarquia clara, mas a figura das mesmas aumenta a competição entre os machos, evidenciando o status de cada um deles (Souto, 2000: 129).
(***) Eu leio de tudo um pouco, sobretudo quando tenho dúvidas e idéias.

sábado, 21 de novembro de 2009

Apresentação


Sem criatividade o título, não é? É típico de quem não é um Macaco Alfa, entendeu? Pensei nisso quando estava procurando por algo assim para este novo blog alternativo.

Aceitei o convite para integrar uma rede de blogs chamada O Pensador Selvagem – OPS!

[clique] http://macacoalfa.opsblog.org

Lá está agora o Macaco Alfa com visibilidade maior e dono de si próprio. Entretanto, estou levando uma verdadeira surra para me habituar ao Wordpress e enquanto não consigo dominar isso, eis aqui o que ficou para trás!

A minha vivência como “blogueiro” é de apenas um ano. Entretanto, amei a experiência inicial no Macaco Alfa. Os posts foram crescendo, muitos deles compreenderam desabafos, noutros soltei opiniões e até hipóteses das mais difíceis para mim mesmo.

Os textos sobre ciência com tons autobiográficos não são exclusividade minha. Há livros muito bacanas que amei nesse mesmo estilo, dos quais cito três de meus mais queridos:

Jordan, B., 2005. O espetáculo da evolução - Sexualidade, origem da vida, DNA e clonagem. Editora Jorge Zahar.

Sapolsky, RM., 2004. Memórias de um primata: a vida pouco convencional de um neurocientista. Companhia das Letras.

Varella, D., 2007. O médico doente. Companhia das Letras.

Já na parte de opinião, muitas vezes realizei verdadeiras catarses! Então é essa a minha mistura espontânea, a chamada "ciência com café"!!!

Enquanto não volto ao Alfa, aqui no Ômega às coisas seguirão na linha alternativa. Pensei em algo que apenas flertava antes, por exemplo, não era apenas uma questão de escrever sobre discriminação, é viver no meio dela! Não estar no topo, ler sobre pesquisas de comportamento humano, genética, modelos sócio-econômicos e sempre se encaixar no comum, entre o povo!

Se você está sempre na platéia e nunca nas telas, tão pouco em cima de palcos com uma guitarra na mão... Este é seu lugar!!!

Se um dia você ouviu a frase clássica “os últimos serão os primeiros”, é um sonho de macacos ômega... é o nosso sonho no dia a dia!

Meus queridos amigos primatas, bem vindo de volta à ciência, política e o humor de sempre... Agora assumidamente no “lado B” das coisas!!!

Eis o Macaco Ômega!!!